A Articulação Recife de Luta vem a público manifestar sua solidariedade às famílias afetadas pelas fortes chuvas que atingiram a Região Metropolitana do Recife (RMR) e as Zonas da Mata Norte e Sul de Pernambuco em 12 e 13 de maio de 2021. De acordo com matéria veiculada no Jornal do Comércio, neste período choveu 60% do esperado para maio, as precipitações foram de 200,4 milímetros em dois dias quando o esperado para o mês inteiro era 328,9mm. Como de costume, a infraestrutura de drenagem pluvial das cidades pernambucanas não deu conta de escoar toda a água da chuva ocasionando inúmeros transtornos para a população.
Durante a madrugada de quarta (12/05), quando a APAC emitiu seu primeiro alerta, e ao longo da quinta feira (13/05), as nuvens carregadas e a neblina tomaram conta do céu, escondendo prédios e casas. Várias avenidas de grande relevância para o transporte público intermunicipal ficaram literalmente debaixo d’água, impossibilitando muitos trabalhadores de retornar para as suas residências. Esse foi o caso das Avenidas Mascarenhas de Moraes, Recife, Beberibe, Presidente Kennedy, Carlos de Lima Cavalcanti e da Rodovia PE-15. Em Cavaleiro, Jaboatão dos Guararapes, uma família inteira chegou a ser soterrada por um deslizamento de barreira. De acordo com a equipe de resgate, pai e filha foram encontrados abraçados no sofá. Também foram registrados deslizamentos de terra em Camaragibe, Paulista e Ipojuca.
Os canais e rios também subiram de nível, alguns deles chegaram a transbordar. Esse foi o caso do Rio Fragoso em Olinda. Muitos moradores precisaram subir seus móveis, perderam documentos e eletrodomésticos ou precisaram procurar outro lugar para ficar enquanto a água não baixava.
Em matéria da Marco Zero Conteúdo, veiculada em 14/05/21, residentes do bairro de Jardim Fragoso lembram que não é primeira vez que se prejudicam com alagamentos em período de chuva intensa, e que a situação piorou muito em face das obras de intervenção e requalificação do “Canal do Fragoso” – que estão sob a responsabilidade da CEHAB e da Prefeitura de Olinda e foram iniciadas em 2013 com previsão de finalização em 2016. As obras estão inseridas no projeto de criação da Via Metropolitana Norte, que de acordo com os especialistas na área ambiental, tem um caráter estritamente rodoviarista e não visa resolver as questões de drenagem do município. As obras do eixo viário que vai conectar a PE-15, em Olinda, com a PE-01, em Paulista, somam um total de R $451,8 milhões entre recursos federais e estaduais.
A falta de priorização orçamentária para obras de drenagem que visem prevenir os transtornos ocasionados pela chuva, melhorando o escoamento das águas pluviais, também acomete a cidade do Recife. No dia 05 de maio deste ano foram retirados cerca de 5 milhões de reais da ação de Requalificação dos Cursos de Água para a área de comunicação, conforme decreto Nº 34.543 do dia 05 de maio, publicado no Diário Oficial de 06/05/2021 da Prefeitura da Cidade do Recife (Imagem abaixo).
Vale ressaltar que se trata da mesma prefeitura que em 2019 apresentava na Conferência Brasileira de Mudança do Clima (CBMC) a “Análise de Riscos e Vulnerabilidades Climáticas e Estratégia de Adaptação do Município do Recife”. O material identificou 14 medidas de adaptação que tem como objetivo aumentar a resiliência de áreas com alto risco de: inundação, deslizamento e doenças transmissíveis no município, entre outros. Dentre as medidas de adaptação apresentadas pelo prefeito Geraldo Julio na ocasião estão “a modernização das redes de drenagem existentes, requalificação urbana em áreas inundáveis, costeiras e de encostas que possibilitam o enfrentamento de ameaças de inundação e deslizamento (etc)”. (Trecho retirado do site da prefeitura: http://www2.recife.pe.gov.br/node/290231). No entanto, mesmo com todos os estudos já elaborados, bairros como o IPSEP, Jordão, Cordeiro e Estância continuam vivenciando água na altura da cintura em dias de precipitação extrema no Recife, exatamente o que ocorreu entre 12 e 13 de maio.
Ao priorizar propaganda no instagram, as obras estruturantes que visem a prevenção do risco, os estudos que mapeiam as áreas críticas, os órgãos com plena capacidade de monitoramento das mudanças no clima, e, por fim, a assistência, o socorro e a posterior reconstrução das estruturas afetadas pelas ocorrências ficam em segundo plano para a PCR. Esses são os quatro eixos que estruturam o “Plano Nacional de Gestão de Riscos e Resposta a Desastres Naturais” elaborado pelo Governo Federal em 2012. Este chegou a prever a destinação de cerca 15,6 bilhões de reais para ações de controle de riscos em 17 Regiões Metropolitanas do Brasil, sendo a RMR uma delas.
Até quando os trabalhadores das cidades de Pernambuco terão que perder seus pertences? Estar expostos a contaminação de doenças transmissíveis pela água que transborda dos rios e canais e pelos mosquitos que nela se reproduzem? Até quando “mais vidas” serão ceifadas nos morros pela movimentação de terra que poderia ser evitada? Que a dor dos que perderam seus parentes nas chuvas de maio possa ser confortada. A chuva é natural, o desastre é descaso com o povo!
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